Introdução
A Constituição Federal de 1988 define um sistema de repartição de competências entre os entes federativos – União, Estados, Distrito Federal e Municípios –, que organiza as responsabilidades e poderes de cada nível governamental para atender a interesses nacionais, regionais e locais. Este modelo envolve princípios de subsidiariedade, poderes implícitos e técnicas de repartição que garantem o equilíbrio e a cooperação federativa. Este módulo aborda as competências constitucionais e as questões interpretativas associadas.
Repartição Constitucional de Competências
Princípios Norteadores
- Princípio da Predominância do Interesse: Esse princípio estabelece que a União deve cuidar das questões de interesse nacional, os Estados de assuntos regionais e os Municípios de temas locais. O Distrito Federal possui uma competência híbrida, com responsabilidades regionais e locais.
- Princípio da Subsidiariedade: Este princípio sugere que as decisões devem ser tomadas no menor nível possível, ou seja, que o exercício de competências deve ser delegado a instâncias superiores apenas quando os níveis inferiores não puderem atender de forma eficaz. Embora a subsidiariedade não esteja explicitamente prevista na CF, ela orienta a repartição de competências.
- Princípio dos Poderes Implícitos: Permite que os órgãos estatais utilizem meios necessários para atingir seus objetivos constitucionais. No RE 535.478/SC, o STF reconheceu que o Ministério Público, além de promover a ação penal, tem competência para colher provas, exemplificando a aplicação desse princípio.
Técnicas de Repartição de Competências
- Repartição Horizontal: Define competências exclusivas para cada ente, evitando invasões.
- Repartição Vertical: Estabelece competências em diferentes níveis, permitindo a coordenação e a complementação entre os entes.
Tipos de Competência
- Competência Legislativa (Formal): Relaciona-se à criação de leis, exercida tipicamente pelo Poder Legislativo.
- Competência Administrativa (Material): Relaciona-se à implementação de políticas públicas e exercício do poder de polícia, executada pelo Poder Executivo.
Classificação por Forma
- Enumerada ou Expressa: Estabelecida explicitamente na CF.
- Reservada ou Remanescente: Competência atribuída aos Estados para as matérias não vedadas pela CF (Art. 25, § 1º).
Classificação por Extensão
- Exclusiva: Competência exclusiva de um ente, sem possibilidade de delegação (Art. 21).
- Privativa: Competência que pode ser delegada, como indicado no Art. 22, parágrafo único, onde a União pode autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas.
Competências Comuns e Concorrentes
- Competência Comum: Competências compartilhadas por todos os entes (Art. 23), envolvendo temas como proteção ambiental e combate à poluição.
- Competência Concorrente: União, Estados e Distrito Federal compartilham competências, sendo a União responsável por estabelecer normas gerais (Art. 24). Os Estados podem suplementar essas normas.
Critérios Constitucionais de Repartição de Competências
Campos Específicos
- União: Detém competências exclusivas, incluindo a defesa nacional, emissão de moeda e relações internacionais (Art. 21).
- Estados: Competências não vedadas pela CF, abrangendo assuntos de interesse regional.
- Municípios: Competências relacionadas a temas de interesse local (Art. 30).
Possibilidade de Delegação
A União pode delegar competências aos Estados por meio de lei complementar, conforme Art. 22, parágrafo único. Essa delegação deve ser específica e abrangente, não aplicando-se aos Municípios.
Competências Administrativas Comuns
Essas competências permitem a cooperação entre União, Estados, DF e Municípios para alcançar o equilíbrio nacional e bem-estar social, exigindo a criação de normas de cooperação (Art. 23, parágrafo único).
Competências Legislativas Concorrentes
Na competência concorrente, a União estabelece normas gerais e os Estados podem atuar com normas específicas na ausência de legislação federal. Se a União cria uma lei sobre o tema, ela suspende a eficácia da lei estadual conflitante (Art. 24, § 4º). Esse fenômeno permite o efeito repristinatório tácito, onde, ao ser revogada a norma geral federal, a norma estadual suspensa volta a ter vigência.
Casos Práticos e Jurisprudência
ADPF 672 e o Federalismo Cooperativo
Durante a pandemia de COVID-19, a ADPF 672 tratou da competência dos entes federados para implementar medidas de saúde pública. O STF, em decisão do Min. Alexandre de Moraes, reconheceu a competência concorrente dos Estados e a competência suplementar dos Municípios para adotar medidas de isolamento social, em conformidade com a CF. Foi decidido que o Governo Federal não poderia desautorizar as ações locais, reforçando a autonomia federativa e o princípio do federalismo cooperativo.
Conclusão
A repartição constitucional de competências é um mecanismo que organiza o exercício dos poderes federativos, permitindo a atuação coordenada e respeitosa entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Os princípios de subsidiariedade e de poderes implícitos garantem que cada ente atue dentro de seu escopo, e que a delegação e cooperação sejam respeitadas conforme as necessidades locais, regionais e nacionais.
Assertivas Principais
- A União legisla sobre temas de interesse nacional, os Estados sobre interesses regionais, e os Municípios sobre interesses locais.
- O princípio da subsidiariedade orienta a alocação de competências no nível mais próximo da população.
- As competências privativas podem ser delegadas pela União aos Estados, mas não aos Municípios.
- O STF reforçou, durante a pandemia, o papel dos Estados e Municípios em medidas de saúde pública, reconhecendo sua competência concorrente e suplementar.
Fonte de Conhecimento
- Anotações de Materiais Didáticos apresentados em sala de aula