Organização Político-Administrativa do Estado Brasileiro – Parte 3

Introdução

A Constituição Federal de 1988 define um sistema de repartição de competências entre os entes federativos – União, Estados, Distrito Federal e Municípios –, que organiza as responsabilidades e poderes de cada nível governamental para atender a interesses nacionais, regionais e locais. Este modelo envolve princípios de subsidiariedade, poderes implícitos e técnicas de repartição que garantem o equilíbrio e a cooperação federativa. Este módulo aborda as competências constitucionais e as questões interpretativas associadas.

Repartição Constitucional de Competências

Princípios Norteadores

  1. Princípio da Predominância do Interesse: Esse princípio estabelece que a União deve cuidar das questões de interesse nacional, os Estados de assuntos regionais e os Municípios de temas locais. O Distrito Federal possui uma competência híbrida, com responsabilidades regionais e locais.
  2. Princípio da Subsidiariedade: Este princípio sugere que as decisões devem ser tomadas no menor nível possível, ou seja, que o exercício de competências deve ser delegado a instâncias superiores apenas quando os níveis inferiores não puderem atender de forma eficaz. Embora a subsidiariedade não esteja explicitamente prevista na CF, ela orienta a repartição de competências.
  3. Princípio dos Poderes Implícitos: Permite que os órgãos estatais utilizem meios necessários para atingir seus objetivos constitucionais. No RE 535.478/SC, o STF reconheceu que o Ministério Público, além de promover a ação penal, tem competência para colher provas, exemplificando a aplicação desse princípio.

Técnicas de Repartição de Competências

  1. Repartição Horizontal: Define competências exclusivas para cada ente, evitando invasões.
  2. Repartição Vertical: Estabelece competências em diferentes níveis, permitindo a coordenação e a complementação entre os entes.

Tipos de Competência

  1. Competência Legislativa (Formal): Relaciona-se à criação de leis, exercida tipicamente pelo Poder Legislativo.
  2. Competência Administrativa (Material): Relaciona-se à implementação de políticas públicas e exercício do poder de polícia, executada pelo Poder Executivo.

Classificação por Forma

  • Enumerada ou Expressa: Estabelecida explicitamente na CF.
  • Reservada ou Remanescente: Competência atribuída aos Estados para as matérias não vedadas pela CF (Art. 25, § 1º).

Classificação por Extensão

  • Exclusiva: Competência exclusiva de um ente, sem possibilidade de delegação (Art. 21).
  • Privativa: Competência que pode ser delegada, como indicado no Art. 22, parágrafo único, onde a União pode autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas.

Competências Comuns e Concorrentes

  1. Competência Comum: Competências compartilhadas por todos os entes (Art. 23), envolvendo temas como proteção ambiental e combate à poluição.
  2. Competência Concorrente: União, Estados e Distrito Federal compartilham competências, sendo a União responsável por estabelecer normas gerais (Art. 24). Os Estados podem suplementar essas normas.

Critérios Constitucionais de Repartição de Competências

Campos Específicos

  1. União: Detém competências exclusivas, incluindo a defesa nacional, emissão de moeda e relações internacionais (Art. 21).
  2. Estados: Competências não vedadas pela CF, abrangendo assuntos de interesse regional.
  3. Municípios: Competências relacionadas a temas de interesse local (Art. 30).

Possibilidade de Delegação

A União pode delegar competências aos Estados por meio de lei complementar, conforme Art. 22, parágrafo único. Essa delegação deve ser específica e abrangente, não aplicando-se aos Municípios.

Competências Administrativas Comuns

Essas competências permitem a cooperação entre União, Estados, DF e Municípios para alcançar o equilíbrio nacional e bem-estar social, exigindo a criação de normas de cooperação (Art. 23, parágrafo único).

Competências Legislativas Concorrentes

Na competência concorrente, a União estabelece normas gerais e os Estados podem atuar com normas específicas na ausência de legislação federal. Se a União cria uma lei sobre o tema, ela suspende a eficácia da lei estadual conflitante (Art. 24, § 4º). Esse fenômeno permite o efeito repristinatório tácito, onde, ao ser revogada a norma geral federal, a norma estadual suspensa volta a ter vigência.

Casos Práticos e Jurisprudência

ADPF 672 e o Federalismo Cooperativo

Durante a pandemia de COVID-19, a ADPF 672 tratou da competência dos entes federados para implementar medidas de saúde pública. O STF, em decisão do Min. Alexandre de Moraes, reconheceu a competência concorrente dos Estados e a competência suplementar dos Municípios para adotar medidas de isolamento social, em conformidade com a CF. Foi decidido que o Governo Federal não poderia desautorizar as ações locais, reforçando a autonomia federativa e o princípio do federalismo cooperativo.

Conclusão

A repartição constitucional de competências é um mecanismo que organiza o exercício dos poderes federativos, permitindo a atuação coordenada e respeitosa entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Os princípios de subsidiariedade e de poderes implícitos garantem que cada ente atue dentro de seu escopo, e que a delegação e cooperação sejam respeitadas conforme as necessidades locais, regionais e nacionais.

Assertivas Principais

  • A União legisla sobre temas de interesse nacional, os Estados sobre interesses regionais, e os Municípios sobre interesses locais.
  • O princípio da subsidiariedade orienta a alocação de competências no nível mais próximo da população.
  • As competências privativas podem ser delegadas pela União aos Estados, mas não aos Municípios.
  • O STF reforçou, durante a pandemia, o papel dos Estados e Municípios em medidas de saúde pública, reconhecendo sua competência concorrente e suplementar.

Fonte de Conhecimento

  • Anotações de Materiais Didáticos apresentados em sala de aula